Alguma coisa acontece: momentos de respiro na Paulicéia Desvairada
Cultura X Lógica produtivista. Quem vence a batalha?
🏃🏽♂️💨 A cultura entre a pressa e a permanência
Por , produtor de conteúdo do @vivasp_cultura
Ao conversar com alguém que vem para São Paulo pela primeira vez, é comum que apareça em algum momento a sensação de que “os paulistanos estão sempre com pressa”. Para quem não vivencia o cotidiano da selva de pedra, causa estranhamento – e até dificuldade de compreensão – o ritmo acelerado que a cidade e seus habitantes vivenciam. Esse fluxo contínuo de deslocamentos, de informações, gera um movimento que ressoa também nas experiências culturais. Parece uma tarefa hercúlea dar conta de tantas atividades simultâneas nas mais diversas linguagens e espaços espalhados pela capital – desde as megaexposições ou as grandes temporadas teatrais até o circuito de galerias ou o teatro independente. Fato é que, para quem gosta de uma agenda cheia, São Paulo tem opções quase que 24/7.
Por isso, quando embarquei para o outro lado do Atlântico para viver uma experiência de intercâmbio em uma cidade com menos de 40 mil pessoas, a primeira coisa que me falaram foi, justamente, que eu ia estranhar esse ritmo de vida. E de fato. Estando em Évora, interior de Portugal, a realidade cultural é bem diferente daquela que vivia até pouco tempo no centro da metrópole que moldou meu olhar e minha forma de me relacionar com as artes. Mas aqui tenho refletido sobre dois pontos, em especial.
O primeiro deles é a relação com o patrimônio. Não só aqui em Évora, mas em outras cidades portuguesas que visitei, as camadas históricas se sobrepõem e são valorizadas de modo a ressaltar justamente o tempo que cada localidade possui, e seus inúmeros acontecimentos ao longo dos séculos. No centro da cidade, um templo da época da ocupação romana partilha o horizonte com uma catedral do século XII e outros edifícios centenários. É verdade que essa consciência da valorização da própria história é de certa forma recente – muitos dos patrimônios portugueses foram utilizados de diversas formas ao longo do tempo – este templo, por exemplo, já foi usado como açougue -, sofreram alterações ou reconstruções (em especial após o terremoto de 1755) ou deixaram de existir. Mas desde meados do século XIX uma consciência da importância de salvaguardar o que ainda existia começou a aparecer, o que permitiu campanhas de restauro e o surgimento de uma consciência educativa que perdura até hoje. Nesse sentido, fico pensando em tantas e tantas edificações que sumiram da paisagem paulistana, ou que ainda hoje são pouco preservadas, como a Igreja dos Aflitos na Liberdade, ou o Convento do Carmo na Sé.
Outro ponto é justamente a relação com as atividades culturais não-permanentes. E aqui penso que, para mim, está a grande diferença com o dia a dia da cena cultural paulistana. Mesmo em Lisboa, uma capital, a quantidade de museus com exposições temporárias é largamente reduzida quando comparada com as grandes mostras do acervo das coleções nacionais e internacionais. Se em São Paulo estava acostumado a retornar a um museu toda vez que uma nova exposição temporária era aberta, muitas vezes ao ano, aqui voltar a um espaço significa ter a oportunidade de olhar novamente (e as vezes de uma outra forma) uma peça que já estava ali antes, e que vai permanecer depois. O aceleramento da programação expositiva paulistana aqui, para mim, deu lugar a um outro ritmo – uma oportunidade de entrar em contato com algo mais perene. Isso me fez refletir bastante, já que mesmo os grandes museus de São Paulo - que contam com acervos excelentes - por vezes não trabalham com eles tanto quanto com mostras ou propostas de curta duração.
Esses são dois lugares de reflexão que tenho revisitado muito nos últimos dias. O que permanece em uma São Paulo que aparentemente nunca pode parar, em que o progresso é a lei soberana, e em que o desenvolvimento muitas vezes se dá a partir do apagamento do que veio antes? E como esse ritmo acelerado também não nos faz por vezes estar sempre em busca do novo, do que vem em seguida, sem dar espaço para aprofundar ou decantar aquilo que já temos – e que é tão precioso quanto? É claro que isso não significa que devemos abandonar o ciclo de exposições temporárias, ou a renovação das temporadas teatrais, ambas de excelente qualidade. Mas talvez seja a oportunidade de pensar suas durações, de dar tempo ao tempo e permitir que o público revisite aquela proposta, aprofunde seu significado, além de reposicionar a necessidade de valorizar aquilo que já possuímos. Talvez assim a cultura não seja capturada pela velocidade produtivista, e possamos encontrar na Paulicéia Desvairada momentos de respiro em meio a tanta pressa.
🚦 Farol Verde
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Évora é uma das cidades mais lindas que já visitei 💙